por Roberto Ramos
Onde aconchegar-se, se meu mundo não há chão. Nem tão pouco me atrevo tê-la em meus braços, nesse precipício sonoro, se não sou concreto. Sou apenas sentimentos quentes, que se amorna em infinitos pingos que caem dos céus, como, quando da minha jornada, aquelas tuas lágrimas que outrora desmoronou meu coração.
Hoje, vagueio impulsionado pelos filmes coloridos, onde sou teu coadjuvante, teu co-autor, onde soprei juras, verdadeiros murmúrios de amor. Se quiseres assistir a minha versão cinematográfica, então me ausculta atentamente, sente meu coração em ritmo prosopopéico, mergulhando num prelúdio, mergulhando num desejo ávido de sentir teus lábios sedentos. Se há dúvida em qualquer prólogo, pesca as pistas que deixamos espalhadas ao além imaginário, dos bilhetes, das missivas, das pinturas... Recorre aos livros marcados ao teu tempo, e terá, além do filme, concretizado nossos solenes sonetos. E, no final do ato, as luzes ainda apagadas, e, se ainda não bastasse, me permito deixar meus olhos, viajantes, longe do real... Só assim, te encontro. Só assim o meu mais vil, insano e obsceno desejo te alcança. Só assim teu regozijo será meu pleno gozo. E seremos um só, e nem mesmo nós saberemos onde começa um e termina o outro.
Senão pelo lúcido do ser, e, talvez, pela consciência do implacável e lúbrico amor que me invade e toma conta dos impulsos eloqüente da alma, me apavoro, sinto existir apenas no teu mais profundo âmago. Minhas carícias percorrem teu corpo, mas não vejo minhas mãos... apenas o arrepio da tua pele. Toco teus cabelos, mas não vejo meus dedos... apenas o esvoaçar das tuas lindas madeixas. Encosto meus lábios nos teus, num ósculo arrebatador, mas não sinto o calor da tua pele, agora, levemente úmida... apenas levo aos quatro cantos teu cheiro, que como uma flor que na primavera desabrocha, exala.
No meu mais íntimo inconsciente, algo me sugere, que teima e me infunde no ânimo, como que se faz essencial a minha sobrevivência, que minha percepção foge do real por sermos apenas um só em delírios transcendentais.
Sinta-se tocada... Sinta-se beijada... Sinta-se vestida... Sinta-se invadida... Sinta-se no inevitável... Sinta tudo que há em mim pois sou todo amor.
Sinta-se, definitivamente, amada!
Óleo sobre tela: Obra inacabada, "Descobrindo o Jardim Secreto" por Roberto Ramos